20 de julho de 2014

Revolução

Um rio de vontades
Arremetendo com fúria
Contra os muros levantados
Pela indiferença histórica

Um furacão de raivas
Arrancando de raiz
Séculos de injustiças
Edificadas com sangue

Uma multidão de anônimos
Erguendo a voz e o canto
Contra o silêncio imposto
Pelo terror estabelecido

O mundo se levantando
De um letargo forçoso
De uma noite opressora
De um inverno eterno

Uma revolução taciturna
Um povo novo ressurgindo
Um amanhecer desabrochando
Uma esperança se engendrando

14 de junho de 2014

Meditações

Nasceu o sol por trás do horizonte
E a escuridão que se achava eterna
Com um vermelho arrebatamento
Abandonou envergonhada
O palco que a exaltou

Nada é eterno neste universo infinito
A não ser o tempo que nos conduz
Por esta sedutora aventura
Indo e vindo
Surgindo e sumindo
Alçando e descendo
Amando e morrendo

Ninguém permanece para sempre no topo
O impiedoso tempo encarregar-se-á
De demolir os alicerces
De tão arrogante tentativa
As mentiras que o sustentavam
As ofensas que o alimentaram
A hipocrisia que o protegia

26 de abril de 2014

Uma nuvem peregrina

Cansada se arrastava uma nuvem
Deixando um rastro de aflição e pranto
Nem o canto dos pássaros 
Nem a melodia dos ventos
Conseguiam animar seu passo

Quais sinistros presságios 
Arrojará sua andança?
Até onde chegará
Sua infeliz odisseia?

Por que esse abatido gesto?
Por quem tão lastimoso rosto?
Perguntava interessado
Um fugitivo passarinho

Desde onde arrastando essa pena?
Até quando empurrando essa dor?
Indagava intrometida
Uma apreensiva borboleta

Mas a nuvem peregrina
Prolongava sua dolorosa romaria 
Engolindo em segredo suas dores
Soluçando copiosamente suas mágoas

9 de abril de 2014

Repetidamente

Intentando uma e outra vez
Insistindo sempre mais uma vez

Sem reparar no cansaço
Sem render-se ao fracasso

Com o semblante renovado
Com a esperança imaculada

Desvendando o horizonte certo
Desenhando sonhos no céu

Até descobrir a estrela esperada
Até despontar a jornada definitiva

Uma e outra vez
Sempre mais uma vez

8 de março de 2014

Corpo de mulher

Na pele curtida
As marcas profundas
De uma história
Sofrida em silêncio
De um desprezo
Carregado no rosto
De uma ofensa
Injetada na alma

No olhar infinito
Os sonhos germinados
De uma vida ditosa
Sem ódio nem raiva
De um abraço eterno
Sem custo nem ameaça
De um beijo sincero
Sem medo nem pena

Na memória florida
Os nomes gravados
De quem semeou a vida
Com cada gota do seu sangue
De quem levantou a bandeira
Para conquistar o direito
De quem engravidou de rebeldia
Para engendrar um futuro novo

No corpo firme
Os sinais manifestos
De feridas sangrantes
Choradas em noturna solidão
De sacrificados esforços
Na humildade do afeto sem par
De luminosas gargalhadas
Geradas nas redes do amor

21 de fevereiro de 2014

A festa dos idiotas

Cantamos sem refletir
Comemos sem digerir
Beijamos sem saborear
Amamos sem renunciar

Na festa dos idiotas
Nada tem sentido
Tudo virou automático
Sem criatividade
Nem espontaneidade
Alienado rito tragicômico
Repetido até a extenuação

Na festa dos idiotas
Os mais espertos têm a batuta
E dirigem a orquestra
Sem jeito nem maneira
Enquanto os idiotas da vida
Arrastam seus passos
Num frenesi alcoolizado
Num delírio narcotizado

Na festa dos idiotas
Palavras vazias
Enfeitam as paredes e as salas
Enchendo os olhos 
De fascinados leitores
Que engolem a vida
Sem questionar nem sentir

Na festa dos idiotas
A ideologia é servida
Em sedutores pratos
De manjares exóticos
Enquanto empapuçados convidados
Dormitam recostados
Sobre a miséria do mundo

Existimos sem rumo
Dançamos sem gosto
Sofremos sem pranto
Morreremos sem luto

14 de fevereiro de 2014

Me chamarão de louco

Me chamarão de louco
Por sonhar com estrelas impossíveis
Por desenhar florestas no deserto
Por perguntar aos ventos
Quem causou esta barbárie

Me chamarão de louco
Por erguer o rosto ao chegar a tempestade
Por resistir em silêncio agravos e calúnias
Por semear no crepúsculo
Harmonias íntimas de amor e de luta

Me chamarão de louco
Por confiar ainda na bondade humana
Por esperar cada noite o renascer do dia
Por proclamar aos gritos
Que a vida está viva no coração da gente

5 de fevereiro de 2014

Caminhei silencioso

Caminhei silencioso
Para não acordar os ventos
Para não alertar as estrelas
Para não acender o sol

Caminhei silencioso
No meio de sombras
No meio das presas
No meio da dor

Caminhei silencioso
Sem procurar um destino
Sem olhar o vizinho
Sem importar o suor

Caminhei silencioso
Confiando nos sonhos
Confiando nos outros
Confiando em vão

Caminhei silencioso
Passo a passo pela vida
Passo a passo pelo mundo
Passo a passo pela fé